A construção das bases democráticas da República Federativa do Brasil reclama a efetividade do sistema punitivo estatal.

A ideia de responsividade exige que as instituições estejam voltadas à dinâmica do Direito forjado no debate plural e policêntrico, o que significa a concretização da igualdade como princípio estruturante das relações sociais.

Para além da discussão sobre os fins das penas, é preciso indagar: Por que punir?

Tomando como ponto de apoio uma das preciosas lições de Kant, é possível afirmar que o fundamento da punição está escorado no fato de que os seres humanos são agentes autônomos e morais, devendo responder pelos seus atos quando prejudicam terceiros.

A punição, como lembra Vicente Barreto, restabelece a igualdade violada pelo crime, sendo corolário do direito humano fundamental à resposta do Estado diante do mal causado às vítimas e à sociedade. O interdito da lei é um importante marco civilizatório que rompe com a ideia de barbárie (vingança privada).

Hannah Arendt entende que as experiências sofridas em virtude dos regimes totalitários, no decorrer do século XX, tiveram como característica aquilo que denomina de “banalização do mal”, ou seja, graves violações aos direitos humanos eram justificadas na perspectiva da preservação do “espírito do povo” alemão (“volksgeist”), em uma cruzada antissemita sem precedentes na história da humanidade.

Assim, uma visão reducionista dos direitos humanos faz pender a balança apenas para o lado do indivíduo, esquecendo que a punição tem uma dupla função: resgatar a igualdade violada pela prática do delito e mostrar ao delinquente que a resposta do Estado, a qual deve ser justa e proporcional ao fato praticado, serve para fixar limites à sua capacidade de autodeterminação, devolvendo a sua dignidade, vedando-se a instrumentalização.

Por Vinicius Lima

Graduado em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (2002) e Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade de Lisboa (2010). Doutor em Direito Público pela Unisinos (2015). Promotor de Justiça do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Ex-Professor da UNISC, Campus de Capão da Canoa (2013). Ex-Professor da Faculdade de Direito da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul (FMP), nas disciplinas de Processo Penal II e III. Professor do Curso de Pós-Graduação em Direito Penal da FMP. Professor do Curso de Direito da ULBRA, Campus Torres/RS. Autor dos livros Lavagem de Dinheiro & Ações Neutras: Critérios de Imputação Penal Legítima (Curitiba: Juruá Editora, 2014), Teoria Hermenêutica da Responsabilidade Decisória: Direitos sociais entre Ativismo Judicial e Decisão Jurídica Democrática (Curitiba: Juruá Editora, 2016) e Decisão Judicial e Democracia: Por uma Ética da Responsabilidade no Direito Brasileiro (Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017).