O Chile passou a ser o foco das discussões econômicas e sociais nesses dias. Com os protestos abriram-se as agruras da desigualdade no país como um problema social esquecido mesmo com bons índices econômicos quando comparado com outros países latinos.

O Chile é o terceiro país, depois do Qatar e Brasil, com maior concentração de renda em relação ao 1% mais rico da população. Dito de outra forma, o 1% dos super-rico captura 23,7% dos rendimentos brutos totais, já no caso do Brasil a captura é de 28,3% conforme base do WID (World Inequality Database).

No entanto, os estudos sobre a desigualdade como elemento redutor do desenvolvimento econômico e social sustentáveis já vinham denunciando tal situação há tempos. Em 2015, foi desenvolvida uma pesquisa por cinco economistas do FMI (Departamento de Política Estratégica e de Revisão), cujo título é “Causes and consequences of income inequality: a global perspective”. Destaca que a ampliação da desigualdade de renda é um dos maiores desafios da atualidade, uma vez que a distância entre ricos e pobres, nos países desenvolvidos, atingiu o maior grau há anos. Dessa forma, uma maior desigualdade, com a concentração de renda nos mais ricos, retrai o crescimento. Por outro lado, enfatiza que o foco deve estar nas classes pobres e médias, para que ocorra a distribuição de renda e o incentivo ao consumo. Acrescenta que a desigualdade enfraquece o investimento e, consequentemente, o crescimento, trazendo instabilidades econômicas, financeiras e políticas. Evidencia ainda que a desigualdade provocada pela concentração de renda nos ricos e a estagnação dos pobres foram as causas para as crises que afetam o crescimento a curto e longo prazos.

Joseph Stiglitz organizou um estudo com um grupo de economistas, “Rewiriting the rules of the american economy: an agenda for shared prosperity”, em que rejeita os modelos econômicos passados, tendo como base a igualdade e o desenvolvimento econômico como complementares e não antagônicos. Conforme o documento, destaca a desigualdade nos EUA como uma escolha política que enfraquece a economia e faz com que os americanos busquem um estilo de vida para alcançar a Classe Média, enquanto uma pequena parcela da população desfruta da maior riqueza da nação. Sugere, entre outras medidas, controlar a distribuição de riqueza no topo da classe rica e estabelecer regras e instituições que garantam a segurança e a oportunidade para a Classe Média; maior transparência aos mercados financeiros; incentivar o crescimento de negócios em longo prazo, com um imposto sobre transações financeiras; aumentar os impostos sobre ganho de capital e dividendos; incentivar o investimento dos EUA com a tributação sobre o rendimento global de corporações; utilizar a tributação também como meio de influenciar comportamentos, como a eliminação de poluentes e outras despesas fiscais que promovam a ineficiência e a desigualdade; priorizar o pleno emprego por meio de uma reforma monetária; proteger os sindicatos, garantir as normas trabalhistas e o salário mínimo; ampliar o acesso ao mercado de trabalho.

A Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL), em 2012, desenvolveu uma pesquisa, intitulada “Cambio estructural para la igualdad: Una visión integrada del desarrollo”, na qual coloca a igualdade como instrumento para romper com o paradigma econômico que tem prevalecido na América Latina durante ao menos três décadas e a eleva à condição de cidadania, de caráter normativo no campo dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais. Além de diversas alternativas na política econômica, no campo social, o documento destaca, como desafio, que o Estado assuma um papel mais ativo e decidido em políticas de vocação universalista, no qual o Estado e a fiscalidade desenvolvam sistemas mais inclusivos e integrados de proteção social. Assim, a política social teria de seguir essa mudança estrutural, fortalecendo o papel do Estado no âmbito social – contrapondo-se às políticas de austeridade, com restrição fiscal e dos gastos sociais -, a fim de que se evite que elevem as desigualdades, fomentando a capacitação e a incorporação dos trabalhadores nos mercados formais de trabalho como um investimento necessário para a mudança estrutural.
Segundo relatório da Desigualdade Global, da Escola de Economia de Paris, o Brasil é hoje o país democrático que mais concentra renda no 1% do topo da pirâmide. Que essas lições sirvam ao Brasil.

Por Willame Parente Mazza

Pós-Doutor em Direito (Universidad de Sevilla – ES). Doutor em Direito Público (UNISINOS – RS). Mestre em Direito Econômico e Tributário (UCB-DF). Professor de Direito Financeiro e Tributário (UESPI). Auditor Fiscal da SEFAZ-PI.