Não existe uma disputa entre economia e saúde, na qual se priorizar a segunda destrói com a primeira. Isso é um discurso falacioso sem qualquer comprovação científica. O que falta é vontade política para tentar superar a crise e implementar medidas que mexam com setores econômicos talvez nunca incomodados. Deve-se influenciar a atividade econômica para salvar vidas e depois recuperá-la. Não é simples, mas requer o envolvimento das instituições. Assim, há alternativas no âmbito da política tributária e econômica de uma maneira geral. Claro que qualquer medida tomada seriam medidas para minimizar os impactos econômicos, uma vez que há uma previsão de queda do PIB.

Nesse sentido que a ANFIP (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), a FENAFISCO (Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital), a AFD (Auditores Fiscais pela Democracia) e o IJF (Instituto de Justiça Fiscal) divulgaram uma CARTA ABERTA com um conjunto de propostas CONCRETAS de mudanças na tributação nacional com o propósito de apontar FONTES DE RECURSOS para financiar medidas urgentes para enfrentar a pandemia.

Com as medidas estima-se arrecadar R$ 272 bilhões, sendo R$ 100 bilhões para o Fundo Nacional de Emergência para Estados e Municípios.

Essas medidas somadas a outras alternativas, com uma atuação mais intervencionista e forte do Estado, com estímulos fiscais, com a participaçao do Banco Central, dos bancos públicos, da cooperação entre os entes federativos, de intervenções financeiras, da fixação de renda mínima, de medidas no âmbito das obrigações tributárias, além das alterações legislativas que preservem a relação empresa e empregado, aliadas às medidas para saúde, determinadas pela ciência e especialistas, podem conter ou minimizar os efeitos da crise, SALVANDO VIDAS.

Abaixo destaco um resumo que fiz das medidas propostas pelas entidades acima. O documento completo encontra-se no link em anexo.

PREMISSAS BÁSICAS:

1 – “O Estado deve exercer papel fundamental na garantia de direitos sociais e individuais e na promoção do crescimento e do desenvolvimento nacional inclusivo.”

2 – “No Brasil a austeridade econômica colocou limites ao desenvolvimento do Estado Social inaugurado em 1988.”

3 – “A Educação e a Seguridade Social (SUS Previdência Social, Assistência Social e Seguro-desemprego) têm sido minadas pela série de medidas e reformas implantadas nos últimos anos”.

4 – O SUS é baseado no federalismo cooperativo, sendo que a maior responsabilidade recais sobre os governos estaduais e municipais de maior porte, devendo, assim, ser entregue a eles a maior parcela de recursos resultante dessa medidas tributárias.

5 – Além do reforço do SUS, deve haver esforços no sentido de implantação de programa emergencial para garantia de renda para os trabalhadores (desempregados, autônomos e informais), para a população mais pobre e para micro e pequenos empresários.

6 – O FAT/seguro-desemprego deve ser fortalecido e flexibilizado para acolher os trabalhadores  atingidos pelas medidas de prevençao do COVID-19.

7 – Revogação imediada do Teto dos Gastos para poder alocar os recursos nas áreas necessárias para conter a pandemia, assim como suspender todas as votações afinadas com a redução do papel do Estado (PECs 186, 187 e 188).

8 – Somos o país mais desigual do planeta, no qual quase 30% da renda está na mão de apenas 1% dos habitantes do país, devido a isenções no topo da pirâmide, uma tributação maior sobre o consumo, menor sobre patrimônio e riqueza.

PROPOSTAS

As medidas são para ampliar a capacidade financeira do Estado, no qual os recursos adicionais devam ser reunidos no Fundo Nacional de Emergência para reforçar preferencialmente a capacidade de atendimento do SUS.

1 – Criação da Contribuição Social sobre Altas rendas das pessoas físicas (CSPF), com incidência imediata sobre rendimentos de qualquer natureza que ultrapassem a R$ 80 mil reais por mês.

2 – Criação de alíquota adicional extraordinária de 30%, com vigência temporária, da Contribuição Social sobre o lucro líquido (CSLL) para as instituições financeiras.

3 – Aumento de alíquota da CSLL para as empresas do setor extrativo mineral, bem como de outros setores que apresentem alta lucratividade e baixo nível de empregos.

4 – Revogação imediata da isenção do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) sobre lucros e dividendos distribuídos, ou remetidos ao exterior, e modificação da Tabela Progressiva.

5 – Revogação da possibilidade de dedução dos juros sobre o capital próprio na apuração do lucro tributável da pessoa jurídica.

6 – Criar regra estabelecendo que o IRPJ e a CSLL das pessoas jurídicas exportadoras, cujas receitas de exportação sejam superiores a 80% da Receita Bruta, não poderão ser inferiores ao valor obtido pela aplicação das regras da tributação pela modalidade de Lucro Presumido.

7 – Aumentar a alíquota máxima do ITCMD para 30%, permitindo aos Estados e Distrito Federal maior autonomia para imprimir aplicação mais progressiva deste tributo, alinhada com a experiência internacional.

8 – Instituição do Imposto sobre grandes fortunas (IGF).

MEDIDAS PARA AUMENTAR A EFICÁCIA ARRECADATÓRIA

9 – Exigência de pagamento ou de prestação de garantia do crédito tributário como condição de interposição de recursos administrativos. (Essa medida para mim é bastante discutível constitucionalmente)

10 – Medidas que permitam a indisponibilização de bens, de ativos financeiros, habilitação em créditos a receber de terceiros, e o impedimento de distribuição de lucros de empresas devedoras, desde que inscrita em Dívida Ativa.

11 – Alteração da lei que trata de crimes contra a ordem tributária para evita a extinção de punibilidade nos casos de pagamento ou parcelamento dos débitos tributários.

12 – Revogar normas que prevejam a possibilidade de apropriação de créditos tributários que não tenham sido comprovadamente pagos na etapa anterior.

MEDIDAS NÃO TRIBUTÁRIAS

13 – Instituição de participação especial à atividade de extração mineral, nos moldes do que se aplica à exploração de petróleo.

14 – Criação do FUNDO NACIONAL DE EMERGÊNCIA (FNE) para atender as demandas dos E, DF e M, voltadas ao enfrentamento da crise sanitária e a retomada do crescimento econômico. O fundo será composto por: 50% da CSPF + 50% da CSLL + 20% do IR da revogação dos lucros e dividendos + 50% do IGF, totalizando R$ 100 bilhões.

 

Por Willame Parente Mazza

Pós-Doutor em Direito (Universidad de Sevilla – ES). Doutor em Direito Público (UNISINOS – RS). Mestre em Direito Econômico e Tributário (UCB-DF). Professor de Direito Financeiro e Tributário (UESPI). Auditor Fiscal da SEFAZ-PI.

 Acesso à carta aberta das entidades fiscais

https://direitoentreciencias.com.br/2020/03/26/tributar-os-ricos-para-enfrentar-a-crise-fundo-nacional-de-emergencia-de-r-100-bilhoes-para-estados-e-municipios/